Wednesday, February 08, 2006

Sim, eu sou muito atrapalhado...

Lá em casa, depois do Ano Novo, todo mundo se larga pra praia, menos o meu pai. E eu e a minha irmã, claro. Tá, mas aí vão dizer: “então é só a tua mãe”. Sim, lá de casa mesmo é só a mãe, mas vão também minhas outras irmãs e meus sobrinhos. E como eles vivem lá em casa, digo que todos lá de casa foram pra praia. Meu pai reluta ao máximo em ir porque tem medo de ladrão. Já entraram duas vezes lá em casa. É uma sensação horrível.. entrar em casa e ver tudo jogado pelo chão, tudo revirado. Marcas de pés nas paredes, grades entortadas, fechaduras arrombadas...

Meu pai, o Seu Antônio, sabe que eu quase não paro em casa, então ele acha que a casa fica muito vulnerável à ação dos arrombadores e prefere abrir mão de estar na praia com o resto da família. Fica de sentinela, de olho nos gatunos. Além de ficar atento a qualquer barulhinho estranho, ele vive fazendo benfeitorias em relação à segurança da nossa casa, que mais parece um forte. Ou pior: um presídio. Já escrevi aqui da saudade que eu tenho do tempo que nosso muro era de pedra, na altura do peito. Ficávamos horas e horas pendurados com a gurizada lá da rua conversando no muro. Hoje o velho murinho inofensivo de pedra deu lugar a grades e mais grades.

Mesmo assim Seu Antônio não cansa.. coloca mais uma corrente e um cadeado, uma tranca pelo lado de dentro, uma trava de segurança, uma lâmpada de presença.. e por aí vai. Fico imaginando o dia que vamos precisar de crachá pra entrar em casa.

Só que tem uma hora que não adianta. A saudade invade o coração turrão do Seu Antônio e ele começa a repensar na necessidade de ficar plantado noites a fio atento a possíveis investidas de malfeitores. “Tu abre o olho aí hein!” Quando ele fala isso eu já sei, ele vai pra praia.

Aí entra meu estabanamento...

Ele não para de me dar recomendações. É ração pros cachorros, água, regar as plantas, juntar a sujeira do pátio, não sair de casa sem fechar tudo, verificar a caixa de correspondências todos os dias, não deixar luzes acesas... metade do que ele fala eu não processo. Mas também.. são coisas que já estão meio intrínsecas ao senso de segurança e vida social. Mas tem uma coisa que eu não consigo.. cozinhar. Eu já não como em casa quando tem comida pronta, que dirá de quando eu tenha que preparar. O problema é que não estou conseguindo nem ao menos ferver o leite!

Hoje foi hilário. As primeiras horas da manhã me lembraram “Um Dia de Fúria”. Acordei meio atrasado e com muito sono. Levantei, olhei pra cama, olhei pro relógio e... tibum! Cama de novo! Tomei um banho rápido pra tentar me acordar e me vesti. Como não tinha café passado nem me estressei em esquentar o leite. Decidi que não estava tão atrasado assim e resolvi que ia parar numa padaria pra tomar café. Quando saí pra porta que dá pro pátio.. tuuuum!!! Shlap shlap... o Duque pulou em cima de mim e começou a me lamber. Voltei e troquei a calça e a camiseta que agora estavam com aquela típica marca de pata de cachorro. Abri novamente a porta, agora com mais cuidado e entrei no carro. Saí com aquele propósito de passar na padaria. Achei uma perto do trabalho.

- Oi.. um café com leite e uma torrada!
- Já te levo o café ali, só que não temos nada de salgado. O falecido ainda não chegou com os salgados. – a mulher já tava falando até do ex-marido.
- Tá, tudo bem, pode ser só o café.

Fiquei ali esperando.. esperando.. esperando. Até que ela disse que a menina tinha ido buscar pão e ia fazer a torrada. Mais uns cinco minutos e, finalmente ela veio com o café e a torrada.

Foi eu colocar a xícara na boca e tocou o telefone. Meu chefe! Bah, chefe ligando a essa hora e eu atrasado não é bom sinal. Era pra dizer que a casa ia ficar sozinha e que todos iam sair, que eu chegasse rápido. Pensei em deixar tudo ali, mas ia ser um desperdício grande. Perguntei se a mulher tinha um copo descartável e embrulhei o restante da torrada. Ela buscou o copo com tampinha e saí.

Quando cheguei no carro tinha um agente da área azul me caneteando.

- Ô cara! Tu já anotou???
- Tu vai sair agora?
- Vou!
- Tá, vai.. mas da próxima vez coloca o bilhete!
- Tá, pode deixar! Desculpa!

Entrei no carro e arranquei, cuidando pra não virar aquele café quase fervendo em cima do banco. Já tava até vendo o desastre.. telefone, mochila, ia molhar tudo! Fui dirigindo rápido e com cuidado.. um olho no trânsito e outro no copo. Uma hora o animal do carro da frente freia de sopetão e eu quase bato, daí sim! “Por que tu bateste?” iam perguntar. “Porque eu tava cuidando o café!” eu ia ter que responder.

Mas não aconteceu nada, graças a Deus, e cheguei com o copinho de café intacto, mochila nas costas, pão embrulhado na outra mão, molho de chaves entre os dedos, uma conta do cartão do pai na boca, telefone também entre os dedos, um óculos de sol na cabeça e o óculos de grau nos olhos. Dei oi pro chefe, que não deve ter entendido nada, subi pra minha sala e tomei, enfim, meu café tranqüilamente.

2 comments:

Anonymous said...

Estes dias te vi reclamando,então lá vai:

1)Bem-feitoria:atitude de "feitor". bondoso.

Benfeitoria:imóvel ou construção que acresce algo a imóvel.

2)"Ele não pára de me ..."

Anne
Tu sabe que sou fã dos teus textos...

Anonymous said...

Sempre leio, mas faz tempo que não deixo algumas palavras pra você, né?
Aqui estão... ;)
Bjitos!

Minhas fotos no