Décio tinha 8 anos quando teve o primeiro contato com um violão. Enquanto a maioria dos gurizinhos da sua idade esfolavam os joelhos jogando bola nas calçadas da Floresta ou na quadra da Florida, ele estava lá, isolado no seu quarto. Abraçado no seu violão e produzinho os primeiros acordes que o despertariam para um gosto ímpar pela música e o revelariam um talento sem igual.
Ao contrário da maioria do hobbys, Décio não abandonou jamais seu violão, e o gosto pela música e por fazer música só aumentou. Seu pai, o Seu Décio, que também era músico de talento, o alimentava com muito Beatles e tudo o que julgasse bom para lapidar os tímpanos debutantes do guri.
Quando eu o conheci, há uns 2 anos, ele já mostrava que tinha uma veia diferente pra coisa. E todos gostavam de ouvi-lo, fosse com a guitarra ou com o violão. Era ele chegar nos churras da galera e já ia um lá desligar o rádio e todos já se acomodavam à sua volta esperando o tom que ele ia dar. O legal de tudo é que ele nunca se mixava, a gente pedia e ele tocava. “Toca aquela, toca aquela outra..!” a gente pedia.
Durante esse tempo ele já passou por algumas bandas. Diz ele que nunca teve a pretensão de seguir uma carreira comercial, embora sempre que tocava o fazia com muita seriedade e dedicação, o que lhe rendia muitos aplausos e admiração. Assim ele nos cativou, e assim que ele sempre arrasta um de nós onde quer que vá tocar.
Ontem ele me ligou. Eu tava na frente do trampo do Pitoko, o esperando pra almoçar e ouvindo o Passado a Limpo, na Pop Rock. Aliás, um dos poucos programas que ainda dá pra se ouvir nessa rádio. Pois bem.. ele ligou..
- Ô cara, tudo bom?
- E aí locão, tudo bem!
- Ô cara, tu tá sentado? - daquele jeito bem pausado do Décio..
- Tô sim..
- Eu preciso te falar um negócio..
- Tá, fala!
- Ô cara.. o vice presidente do Inter... me convidou... (aqui eu pensei que o convite era pra assistir ao jogo nas cabines)
...pra tocar o hino do Inter e o hono do Rio Grande antes do jogo...
(instante de silêncio)
- PUUUUUUUUUTAAAAAQUEEEEOPARIIIIIIIIIIU BATMAN!
- Cara, não tô acreditando..
- Caraaaaaaalho cara, que afude!!! Como é que tu conseguiu isso?
- Um amigo meu blá blá blá conhece o vice presidente blá blá blá e eu to aindo hoje de tarde lá pra passar o som
- Bah, meu velho.. meus parabéns! blá blá blá..
O meu plano era de ir pra aula e pegar a chamada das 21:15. Só que, no meio da tarde ele me mandou uma msg dizendo que tocaria justamente às 21:15. Eu ia ser obrigado a gazear essa aula. Mas a das 19:30 não tinha como faltar. Entrei na aula e segurei até às oito e meia. Saí de fininho e me larguei voando pro Beira Rio. Tão logo entrei no estádio já ouvi um som de guitarra.
Era ele!
Subi alguns degraus na arquibancada e pude vê-lo. Ele tava ali na beira do gramado, ele e sua guitarra. Nos alto falantes de todo o estádio a melodia arrepiante do hino do Rio Grande. Era ele, era o Décio, diante de pelo menos 30 mil colorados, imprensa, funcionários e de todos que possuíam ouvidos. Ele caminhava leve no gramado enquanto tocava. Ao final do hino fez uma graça, deixando a guitarra no suporte e se abaixando pra fazer um solo de encerramento.
Quando terminou, o locutor do estádio anunciou:
- Agora Décio Jr. Vai tocar o hino do Sport Club Internacional!!!!
A galera já começou a vibrar. Ele tirou a camisa preta e revelou uma camiseta branca do Inter. Fez um sinal com os braços e levantou ainda mais a massa. E tocou o hino do Colorado. Eu arrepiei. Eu não conseguia acreditar que era ele, o Décio, que tava ali.
Fico imaginando o que representou esse momento pra ele. Com certeza nada paga. Um presente que ele e nós todos merecemos. Fiquei muito feliz por ele mesmo. O cara é o cara! Não conseguimos nos encontrar depois do jogo. Não vejo a hora de sentar com ele numa mesa de bar e saber, no tete a tete os pormenores de tudo.
2 comments:
Raul, SÉRIO: eu NÃO CREIO. E eu perdi. NÃO CREIO 2. Saudade de vcs.
Eu estava la, foi de arrepiar. Parabens a vc pelo texto e ao Décio pelo show.
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