Monday, February 20, 2006

Raulling Stones...

Saí de casa, na sexta, com o espírito programado pra muita aventura. Aventura às ganha! Pra variar, não tinha arrumado nada das minhas roupas. Deixei-as pra lavar na quinta à noite enquanto me arrumava pro super Pré Carnaval da galera, que foi muito, muito, muito bom! Todas marchinhas de carnaval e mais superfantástico e uni-duni-tê.

Na sexta de manhã soquei as roupas todas na mochila e fui comprar uma bolsa decente no Bourbon. Dali peguei um táxi e fui pro aeroporto.

Coisa bem boa essa de viajar de avião! O momento da decolagem é algo inexplicável. Aquela velocidade toda parece que não pára de aumentar, até que o bicho daquele tamanho ganha o ar.

Sem palavras o momento que passei por Bombinhas. Dava pra ver todas as praias bem direitinho.. Bombas, Bombinhas, Sepultura, Retiro dos Padres, Quatro Ilhas e a maravilhosa Praia da Tainha.

Cheguei no Rio e fui pro albergue tentando me achar com o mapinha que tinha ganho no aeroporto. Era um olho nas plaquinhas das ruas e outro no mapinha. Nem dava pra ver que eu tava perdido.. hehehhe. Dormi no ônibus e, quando acordei, imaginei estar na Atlântica. Dito e feito. Me levantei apavorado e puxei a cordinha. O motora parou e eu desci. A rua do albergue era paralela à Atlântica, duas quadras pra dentro. Mas óbvio que eu desci quase um quilômetro depois. Uma mala, uma mochila, 38 graus na moleira e 1km pela frente...

Finalmente cheguei no tal albergue. Stone of a Beach.. o nome era preza! Já tinha visto uns gringos pela rua, mas a recepção do troço eram só eles! Me dirigi ao balcão pra tentar ser atendido..

How spoipbr can tyudglkj help hkjdhk you?
QUÊ!!!!!???
Qual es kjgfku tu hkhd resiervahodb señor?
Moça, eu falo português!
Ah tá, desculpa!

Ela confirmou minha reserva e passei pro quarto. Cinco beliches, ou seja, dez camas. Só eu de brasileiro. Não cheguei a falar (ou tentar falar) com todos do quaro, mas tinham uma guria e um magrâo australianos e uma outra guria inglesa. Pra falar a verdade, acho que no albergue todo só tinha eu mesmo de brasileiro, nunca vi tanto gringo reunido.

Tomei um banho e fui dar uma conferida no local do show. Bah, só sair na rua do albergue, duas quadras da praia, e ver o palco ali na frente, muito perto mesmo. Ali na praia eu já comecei a observar os tipinhos que figurariam na minha aventura.. neguinho vendendo até a mãe! Um outro fez uma escultura na areia da boca dos Stones com o Mick Jagger sentado com uma guitarra no colo, muito fera.

Procurei uma choperia legal e fui comer alguma coisa. Meu propósito era de acordar às 6h da manhã e pegar um lugar o mais próximo possível da grade que separava da área vip. Já tinha gente acampada àquela hora! Fui no Manuel e Juaquim, uma choperia muito legal. Tomei uns (15 hehehe) chopp e voltei pro albergue. Achei uma cana vazia e capotei. Deixei o recepcionista avisado pra me acordar às 6h.

Conforme o combinado ele me acordou, mas me enrolei um pouco. Preparei a mochila, comprei 4 garrafinhas de água, pilhas pra máquina e fui pra praia. Cheguei por volta das 8:30h. O máximo que consegui chegar foi uns 5m da grade, mas bem na frente de onde chegaria o palco móvel. Acomodei os dois pés ao lado de uma barraca e atrás de uns guardassóis e ali fiquei.

Desafiando os limites da raça humana...

Ali eu já imaginava do que estava por vir.. e eu estava disposto a passar pelo sacrifício que fosse. Durante quase todo o tempo não pude mover os pés. Como eu tinha acordado sem fome, imaginei que não teria fome pelo resto do dia, não sei de onde eu tirei essa tese.. sei que às onze da manhã eu não agüentava mais o calor e a fome. Assim como levantei sem fome, na rua do albergue tabém não tinha sol, mas não era porque estava nublado, era pela sombra dos prédios. E então também não levei protetor solar. O sol eu tentava amenizar com a camiseta. Mas a fome não tinha como enganar.. a minha sorte foi que me enturmei com quatro magrões de Niterói, e eles levaram dois pacotes de pão de sanduíche, queijo e presunto. Quando começaram a comer me ofereceram e eu aceitei, claro.

O tempo parecia que não passava nunca. As pernas doíam, o sol ardia. Tínhamos que nos limitar a respirar. O corpo transpirava sem parar. Duas da tarde... Quanto mais o sol castigava, mais resistentes as pessoas ficavam. Ninguém desistia. No lugar que eu estava não conseguia ao menos sentar no chão. Nem trocar de posição. Horrível! Duas e meia.. Duas e quarenta.. Cada minuto valia por uma hora. E a área vip vaziazinha, a galera devia estar dormindo ainda.

Bom, não sei como agüentei, mas sei que agüentei. Às sete da noite,m quando a gaklera desarmou os guardassóis, me meti por baixo e me acomodei a uma fileira de pessoas da grade. A partir de então nem os braçoa eu podia mexer. O que estava pra baixo ficava pra baixo e o que estava pra cima, ficava pra cima. Começou um fortíssimo empurra-empurra. Todos querendo se aproiximar mais e mais da grade. Até então nada de xixi! E enm pelas horas seguintes. Eu usava a água apenas pra molhar a boca.

Na hora do show do Titãs o empurra-empurra fo mais violento. Algumas pessoas começaram a passar mal e tiveram que ser retiradas. Resisti bravamente.

Finalmente, a tão esperada hora. Os Stones entrariam no palco. Gritaria ensurdecedora. Se não me egano abriram com Jumping Jack Flash.. loucura! Aí foi um salve-se quem puder. Uns pulando, outros tentando manter-se em pé, outros passando mal.. loucura, loucura, loucura. Eu só tentava cuidar da minha mochia que estava com a máquina e me manter em pé, o que era muito difícil. Não tinha nem como abrir a mochila pra pegar a máquina, o nível de esmagamento era extremo.

Na hora que o palco começou a se mover ocorreu a catarse. Achei, sinceramente, que eu participaria da maior tragédia da história. Muita gente passou mal. Eu não trocava aquele momento por nada. Fiquei ali, a menos de dez metros daqueles monstros! Impagável, impagável. Não sei como, mas consegui tira a máquina da mochila e bati umas fotos, sem ver, só com o braço levantado.. nem seise vai sair alguma. Mas o mais importante estava ali, bem ali. Uma oportunidade que provavelmente jamais se repetirá.

Assim que o palco começou a voltar eu saí do tumulto, o que também foi tarefa arduíssima. Queria chegar na praia pra fazer xixi. Depois de uns 15 minutos cheguei. E quem disse que pude.. a praia lotada! Todo mundo dentro da água enlouquecido e pulando. Galera com prancha, com bóia.. Tive que voltar uns 800m até achar dois cara-dura mijando na frente da galera. Foi ali mesmo. Ninguém tava nem aí.. passou um negãozinho e fiz xixi em cima do pé dele. Achei que ele ia se invocar.. que nada, nem viu! Hahhahahaha

Acompanhei o show terminar lá de trás, pelo telão. Loucura! Muito bom mesmo! O Mick esbanja energia que não te deixa sentir cansado. Uma das melhores coisas que eu podia ter feito mpor mim nessa vida. É muito bom ter essa sensação de realização! Na verdade a ficha aind anão caiu!

E ainda tem o U2, amanhã.. aguardem!

Sunday, February 19, 2006

Drops...

To no ciberzinho do albergue, só posso ficar 20 min, que é de grátis..

Há muito pra falar sobre o show de ontem, ao mesmo tempo que para alguns momentos não há palavras pra descrever. Ver os coroas a menos de 10m não tem preço. Valeu todo o torrão do sol, todo o suor, todos os pisões no pé, todos os empurra-empurra, tudo. Por uym momento cheguei a pensar que faria parte de uma das maiores tragédias da humanidade.

Teve muita coisa engraçada. Depois entro num ciber com tempo livre e escrevo.

Muitas saudades de todos!

Wednesday, February 15, 2006

Cardíaco...

Não me considero hipocondríaco, muito pelo contrário. Eu já nem fico doente pra não ter que tomar remédio. Todo ano temos exame médico periódico aqui na Vivo, mas volta e meia eu mato um. Ninguém merece ficar sugando o sangue do cara.

Pois eis que há uns dois dias senti um “desconforto no peito”. Esse foi o termo médico usado pra umas fisgadinhas que eu senti. Foi bem fraquinho, só que como eu sou muito assustado, achei que tava infartando.

Num movimento leve como braço esquerdo pra trás, consegui amenizar a fisgadinha, mas o sentimento de estar tendo um ataque no coração já se abatia sobre mim. Em segundos todos os sonhos de um lar, uma família, filhos.. aquela gurizada ranhenta correndo no pátio, cachorro, viagens.. todas essas coisas começavam a se apagar.

Já podia me ver sendo levado por uma ambulância e tomando aqueles choques que fazem aparecer até o esqueleto do cara, tipo desenho animado.. tudo isso me passou pela cabeça em instantes. Até que caí na real.. pô, eu não sou gordão, bato uma bolinha toda semana, e tenho 28 anos. A vida não seria tão cruel assim comigo. Voltei a trabalhar. Dei umas apalpadas parecidas com exame de câncer de mama e voltei a trabalhar.

O problema é que o tal desconforto não passou. Fiquei dois dias sentindo essas fisgadinhas de leve e pensando todas aquelas coisas de novo. Vou ter que ir ao médico – pensei. Tenho um futuro promissor, não posso ficar a mercê de um ataque cardíaco repentino.

Ia ter que enfrentar o médico, estava decidido. O trajeto aqui da empresa até o hospital foi em contagem regressiva. Ia ser internado e logo passar por uma cirurgia, certo que ia. Como ia avisar os meus pais? E os shows dos Rolling Stones e do U2? E o carnaval??? O carnaval??? Que hora pra ter um problema no coração. Ia ter que fugir do hospital!

Bolei todo o plano de ação.. eles iam tirar toda a minha roupa e colocar aquele pijama verde-clarinho. Azar.. assim que a enfermeira se distraísse eu ia fugir. Ia sair correndo pelo corredor do hospital até conseguir voltar pra casa. Se quisessem que agendassem a data da cirurgia pra março, depois das festividades.

Cheguei no hospital. Meu coração palpitava. Talvez fossem suas últimas batidas. Não tive tempo nem de falar com a mãe, a bateria do telefone tava acabando. Celular é um ótimo consolo nessas horas. Parecia que todos me olhavam como um pré-operado. Tanto que cheguei na recepção e fiquei sem falar, queria que o atendente soubesse do meu problema. Respirei fundo e falei o que estava sentindo.

Fui encaminhado para um Clínico Geral. A agonia tomava conta de mim. E ninguém sabia que eu estava ali. Todos iam saber da tragédia de surpresa. Tentei me acalmar. Percebi que eram dois os clínicos que estavam atendendo: um médico e uma médica. Ele careca, com cabelos só dos lados e meio corcunda. Ela muito bonita, cabelo cor de cobre, usava óculos, seios salientes e devia ter uns 30 anos. Os predicados da doutora serviram pra amenizar minha angústia. Queria ser atendido por ela, não pelo careca corcunda. Se alguém fosse me apertar o peito, escutar meus batimentos, que fosse ela.

-Raul Vieira

Era eu! Era ela! A doutora que ia me atender! Num segundo todas as minhas preocupações com o coração deram vez a uma possível investida com a jovem doutora. Já imaginei ela me colocando numa maca e tirando minha camisa, alisando meu peito... sentindo aquele perfume e olhando para aquele batom vermelho encarnado nos lábios grossos... encostando o ouvido no meu peito..

- Meu nome é Aline, pode sentar – falou bem mais séria do que eu imaginava. – Então, Raul, o que tu estás sentindo?
- Ah.. desde ontem estou sentindo.. blá blá blá.. blá blá blá..

Nada de maca, nada de abrir camisa, nada de ouvidinho no peito! Só estetoscópio..

- Olha, Raul.. parece tudo ok, mas vamos fazer um eletro pra não ter dúvidas. Vou pedir pra enfermeira fazer teu eletro e te dar uma medicaçãozinha. Qualquer coisa tu volta aqui.
- Tá..

Fiquei numa salinha esperando até que veio a enfermeira com aquele monte de chupetinhas na mão. Ia ser eu e o Frankstein. A enfermeira não era em nada parecida com a Doutora Aline, não dava pra ter nenhuma segunda intenção. E essa sim, me colocou na maca. Me encheu daquelas chupetas e ligou o equipamento do eletro.

- Dá choque?
- Hahahahahaha, não.

Imprimiu o eletro e me levou pra salinha de medicação. Vários daquelas hastes metálicas pra soro e uns encostos de braço. Será que ia ser uma injeção? Ah não, injeção não! Dito e feito: injeção!

- Eu tenho medo de injeção!!!! – Anunciei.
- Ah é? Pois eu vou te aplicar uma injeção. – Sarcástica!
- Posso não olhar?
- Pode, claro.. fica pensando na vida.

Olhei pro outro lado e ela foi me apertando com aquelas borrachas de soro. Quando vi tinha uma garrafinha pendurada pingando um suquinho verde num caninho até a minha mão. Quase meia hora depois e começou a terminar o líquido, que eu nem sabia o que era. A enfermeira saiu da sala. Tinham mais duas mulheres na mesma situação que eu. Fiquei preocupado se podia acabar o líquido com a agulha fincada na minha mão. Talvez entrasse ar! E agora? Lembrei que num filme do McGiver um cara matou um desafeto aplicando-lhe uma injeção de ar. Eu ia me livrar de um ataque no coração e ia morrer por ar na veia. Precisava fazer alguma coisa. Pensei em arrancar aquela parafernalha toda. E nada de a enfermeira aparecer!

- Olha, o teu vai acabar! – Disse a senhora que estava na minha frente, prevendo o meu fim.
- Eu vi, mas a enfermeira não aparece.

De repente acabou mesmo todo o líquido do frasco e a mangueirinha começou a esvaziar. Cada centímetro que baixava o nível era desesperador. Segurei o esparadrapo, estava prestes a arrancar tudo! Ouva passos no corredor, mas nenhum era da enfermeira! Olhei pra duas senhoras, olhei pra mangueirinha.. quase vazia.. olhei pra porta..

- Oi! Já acabou?
- Já, tá acabando, tá acabando..
- Calma.. ele não desce todo..

Ela tirou a agulha e deixou o algodão. Levei o exame até a Doutora Aline e ela, como já tinha dito, não achou nada de errado com meu coração. Disse que deve ser algo muscular. De qualquer forma elogiou minha atitude de procurar auxílio médico. Disse pra nunca sentir desconforto no peito sem procurar um médico.

Foi só um susto, menos mal. Mas me fez sentir um monte de sensações e medos que não me ocorriam desde criança. E fez também perceber que nossa vida é tão frágil e tão forte, e que nosso coração passa por essas emoções fortes, mas que não superam as sentimentais.

Friday, February 10, 2006

Arrepio...

Diz que não se faz, mas acho hipocrisia.. eu analiso quase todos os meus relacionamentos, sejam os de amizade ou os de paixões. Faço uma espécie de gráficos e tabelas mentais na busca de evidenciar pontos que levem a uma maneira mais sensata de encontrar alguém que concilie afinidades, química e vontade de querer estar com alguém, e só com este alguém.

As afinidades já temos, cada um, as suas. Podemos mudar um pouco, vir a conhecer lugares, comidas e músicas antes não apresentados. Mas nada que seja tão significativo. A química só se conhece do jeito que aprendemos no primeiro grau: experimentando. Um corpo A reage (ou não) com um corpo B. A isso somam-se as afinidades, os momentos vividos antes desse, e a mística curiosidade do que ainda pode vir a acontecer. Se a reação resultar em uma explosão de sensações, aí está o primeiro passo pra se alcançar o seguinte: a vontade de querer estar só com este alguém.

Às vezes mudamos um pouco a ordem, e colocamos como premissa inicial não estar só com um alguém. Aí podem aparecer afinidades e química, mas vai ser bem mais difícil demover a premissa inicial, ainda mais quando ela for verificada com freqüência.

E quando a ordem é mudada fica difícil mesmo.. a premissa inicial pode até ser a de querer sim, estar só com um alguém, mas se não der espaço à química, por exemplo, tudo vai por água abaixo.

Isso porque ficamos com medo quando alguém abre seus sentimentos em relação a nós. A barreira natural que muitos de nós temos para com novas pessoas se reforça quando essas novas pessoas demonstram algum interesse. Embora eu perceba e saiba o quão arriscado é abrir os sentimentos antes de fechar as três premissas, prefiro assim: deixar claro que há interesse de minha parte. Não deixa de ser uma mudança na ordem, mas a dificuldade em contornar isso, a conquista dos sentimentos alheios até que se perca o medo, a luta contra si próprio, contra o próprio corpo e mente em controlar atitudes, em saber esperar.. isso tudo é o que alimenta mais a vontade de afirmar os três argumentos.

Por isso que considero importante deixar rolar as coisas nessa ordem: afinidades, química e vontade de querer estar só com este alguém que já confirmou os dois argumentos anteriores. Mas os três são fundamentais. É como uma mesa de três pernas. Se uma delas quebra, a mesa desaba. E sobre essa mesa é que, aos poucos, vai se construindo tudo o que vai sendo vivido, como um equilibrista que vai colocando taças de cristal, uma sobre a outra. É a fragilidade de toda relação que investiu nos três pontos fundamentais.

O mais engraçado é que depois que se concretizam esses pontos fundamentais, a parte que antes relutara em aceitar a revelação de sentimentos e interesses, recobra essas afirmações demonstrando uma incerteza e um querer, um medo de não sentir e apostar sozinho.

Quando um peito se abre aparecem muitas coisas lá guardadas. Os órgãos vitais gritam por algo que lhes instiguem a continuar vivos. Pulmões anseiam ofegar e um coração disparar. Por todo um corpo um sangue quer ferver, quando na retina de olhos brilhantes reflete a luz de uma união de formas de forma que se perceba e sinta que nada disso se sente sozinho.

Wednesday, February 08, 2006

Sim, eu sou muito atrapalhado...

Lá em casa, depois do Ano Novo, todo mundo se larga pra praia, menos o meu pai. E eu e a minha irmã, claro. Tá, mas aí vão dizer: “então é só a tua mãe”. Sim, lá de casa mesmo é só a mãe, mas vão também minhas outras irmãs e meus sobrinhos. E como eles vivem lá em casa, digo que todos lá de casa foram pra praia. Meu pai reluta ao máximo em ir porque tem medo de ladrão. Já entraram duas vezes lá em casa. É uma sensação horrível.. entrar em casa e ver tudo jogado pelo chão, tudo revirado. Marcas de pés nas paredes, grades entortadas, fechaduras arrombadas...

Meu pai, o Seu Antônio, sabe que eu quase não paro em casa, então ele acha que a casa fica muito vulnerável à ação dos arrombadores e prefere abrir mão de estar na praia com o resto da família. Fica de sentinela, de olho nos gatunos. Além de ficar atento a qualquer barulhinho estranho, ele vive fazendo benfeitorias em relação à segurança da nossa casa, que mais parece um forte. Ou pior: um presídio. Já escrevi aqui da saudade que eu tenho do tempo que nosso muro era de pedra, na altura do peito. Ficávamos horas e horas pendurados com a gurizada lá da rua conversando no muro. Hoje o velho murinho inofensivo de pedra deu lugar a grades e mais grades.

Mesmo assim Seu Antônio não cansa.. coloca mais uma corrente e um cadeado, uma tranca pelo lado de dentro, uma trava de segurança, uma lâmpada de presença.. e por aí vai. Fico imaginando o dia que vamos precisar de crachá pra entrar em casa.

Só que tem uma hora que não adianta. A saudade invade o coração turrão do Seu Antônio e ele começa a repensar na necessidade de ficar plantado noites a fio atento a possíveis investidas de malfeitores. “Tu abre o olho aí hein!” Quando ele fala isso eu já sei, ele vai pra praia.

Aí entra meu estabanamento...

Ele não para de me dar recomendações. É ração pros cachorros, água, regar as plantas, juntar a sujeira do pátio, não sair de casa sem fechar tudo, verificar a caixa de correspondências todos os dias, não deixar luzes acesas... metade do que ele fala eu não processo. Mas também.. são coisas que já estão meio intrínsecas ao senso de segurança e vida social. Mas tem uma coisa que eu não consigo.. cozinhar. Eu já não como em casa quando tem comida pronta, que dirá de quando eu tenha que preparar. O problema é que não estou conseguindo nem ao menos ferver o leite!

Hoje foi hilário. As primeiras horas da manhã me lembraram “Um Dia de Fúria”. Acordei meio atrasado e com muito sono. Levantei, olhei pra cama, olhei pro relógio e... tibum! Cama de novo! Tomei um banho rápido pra tentar me acordar e me vesti. Como não tinha café passado nem me estressei em esquentar o leite. Decidi que não estava tão atrasado assim e resolvi que ia parar numa padaria pra tomar café. Quando saí pra porta que dá pro pátio.. tuuuum!!! Shlap shlap... o Duque pulou em cima de mim e começou a me lamber. Voltei e troquei a calça e a camiseta que agora estavam com aquela típica marca de pata de cachorro. Abri novamente a porta, agora com mais cuidado e entrei no carro. Saí com aquele propósito de passar na padaria. Achei uma perto do trabalho.

- Oi.. um café com leite e uma torrada!
- Já te levo o café ali, só que não temos nada de salgado. O falecido ainda não chegou com os salgados. – a mulher já tava falando até do ex-marido.
- Tá, tudo bem, pode ser só o café.

Fiquei ali esperando.. esperando.. esperando. Até que ela disse que a menina tinha ido buscar pão e ia fazer a torrada. Mais uns cinco minutos e, finalmente ela veio com o café e a torrada.

Foi eu colocar a xícara na boca e tocou o telefone. Meu chefe! Bah, chefe ligando a essa hora e eu atrasado não é bom sinal. Era pra dizer que a casa ia ficar sozinha e que todos iam sair, que eu chegasse rápido. Pensei em deixar tudo ali, mas ia ser um desperdício grande. Perguntei se a mulher tinha um copo descartável e embrulhei o restante da torrada. Ela buscou o copo com tampinha e saí.

Quando cheguei no carro tinha um agente da área azul me caneteando.

- Ô cara! Tu já anotou???
- Tu vai sair agora?
- Vou!
- Tá, vai.. mas da próxima vez coloca o bilhete!
- Tá, pode deixar! Desculpa!

Entrei no carro e arranquei, cuidando pra não virar aquele café quase fervendo em cima do banco. Já tava até vendo o desastre.. telefone, mochila, ia molhar tudo! Fui dirigindo rápido e com cuidado.. um olho no trânsito e outro no copo. Uma hora o animal do carro da frente freia de sopetão e eu quase bato, daí sim! “Por que tu bateste?” iam perguntar. “Porque eu tava cuidando o café!” eu ia ter que responder.

Mas não aconteceu nada, graças a Deus, e cheguei com o copinho de café intacto, mochila nas costas, pão embrulhado na outra mão, molho de chaves entre os dedos, uma conta do cartão do pai na boca, telefone também entre os dedos, um óculos de sol na cabeça e o óculos de grau nos olhos. Dei oi pro chefe, que não deve ter entendido nada, subi pra minha sala e tomei, enfim, meu café tranqüilamente.

Monday, February 06, 2006

No Stress – No Preconceito...

Além do Pica, meu cunhado, tenho um outro amigo dono de pastelaria, o Tio Ale. O tio é só apelido, é um gurizão. Mas as gurias do Falcatruas têm essa mania de apelidar os guris inserindo um “tio” na abreviação dos seus nomes: Tio Rô, Tio Vini, Tio Ale... sem que eles tenham que ser, necessariamente, tios.

O nome da pastelaria era Tri Pastel, só que o Tio Ale achava que o nome de pastel afugentava quem quisesse apenas tomar uma cerveja, sem ter que comer. Além do que, pastel lembra fritura, e ninguém gosta de ficar com cheiro de fritura. Então o nome da pastelaria foi mudado pra Tri Bar. Como a gente já tinha apelidado o estabelecimento de Tripa, assim ficou, pra nós. Tripa.

Agora quem andasse perdido ali pela Goethe, em busca de um bar com uma gelada, sem que isso sugerisse comer um pastel de tomates secos ou strogonoff e sem ficar com cheiro de fritura, ali estava o Tri Bar, ou, pra nós, o Tripa.

Numa dessas noites de calor intenso eu tava no Tripa saboreando uma Boehmia com uns amigos e analisando os tipos que perambulavam pela movimentada Goethe. Nada perto da Lima e Silva, mas bem que ali na Goethe perambulam uns tipos muito estranhos. É o tio que vende rosas que tem a cara que parece aquelas máscaras de um dos presidentes americanos no filme Caçadores de Emoção, outro tiozinho todo torto que vende bilhetes de loteria com um casaco de lã, não importa a temperatura que faça, um casal de doidos que corre todas as noites de madrugada. Correr na volta do Parcão tudo bem, mas todas as noites, às 2h da manhã é bem estranho.

E tem também o anti-Cristo, um desses mendigos maltrapilhos com cabelos e barba grandes e aspecto de bastante sujo. Vestia uma camiseta No Stress preta já bem desbotada. Por vezes fico imaginando pegar uma criatura dessas, dar um banho e colocar uma roupa limpa. Garanto que algum poderia andar no nosso meio tranqüilamente.

E não foi que alguém teve essa idéia, só que sem a parte do banho... um magrão que tava ali no Tripa numa roda de amigos chamou o mendigo, que logo depois seria apelidado por eles de anti-Cristo. Foi só ele se aproximar da entrada do bar que o segurança já o barrou. Deve ter pensado que o mendigo ia entrar no bar pra pedir dinheiro pros clientes. Aí o tal magrão se levantou e foi falar com o segurança, disse que o mendigo era seu amigo e que estava o convidando pra tomar uma cerveja.

Meio que a contra gosto, o segurança permitiu que ele entrasse. O mendigo sentou-se à mesa com aquela galera, trouxeram-lhe um copo e serviram cerveja bem gelada. Brindaram e ele bebeu com gosto. Tava bem à vontade, até batia com a mão na perna no ritmo da música que tava tocando.

Não tardou muito, até que ocorreu a indisposição. O Tio Ale foi pessoalmente até a mesa e pediu que, se quisessem a companhia do mendigo, que colocassem a mesa no lado de fora do bar, quase na calçada. Sem cerimônia o grupo todo levantou-se e se instalaram na parte de fora, na grama. E o mendigo junto. Brindaram novamente e e beberam todos, não deixando que nada atrapalhasse a animação do grupo, que era grande.

- Que afudê! – foi só o que comentei.

Ficamos mais um tempo ali e fomos embora. Quando fui pagar pro Tio Ale, no caixa, ele já saiu se defendendo...

- Legal a atitude do cara, ali, só que ele podia ter levado o mendigo pra casa dele e ter dado uma cerveja. Tu não acha?
- Éeea... – concordei meio que desconcordando, com a cabeça inclinada.
- Pô, ninguém é obrigado a aturar o cara fedendo ali do seu lado.
- Pois é.. – na verdade eu não queria discutir aquilo.

Paguei a conta e saí. Achei a atitude dele meio preconceituosa, apesar de o argumento dele ser razoável. Se bem que eu não tinha sentido o tal fedor que ele se referia. Mas o preconceito é assim, uma breve leitura visual nos faz criar argumentos que, na maioria das vezes, são falhos.

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